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REPORTAGEM1 de novembro de 2024

Projeto Salvador Social: um divisor de águas na atenção aos mais pobres

The World Bank

Célia Santos, 65 anos, aposentada, no prédio central do CadÚnico, em Salvador

Fotos: Mariana Ceratti/Banco Mundial

Iniciativa da Prefeitura, com apoio do Banco Mundial, ajudou o município a melhorar os serviços de assistência social para encarar uma demanda que já era alta e cresceu depois da pandemia

Em Salvador, não é preciso andar muito para encontrar a população vulnerável e mais pobre, em especial depois da pandemia de Covid-19: ela está nos pontos turísticos, nas ruas de todos os bairros e nos barracos que se avolumam em diversas áreas da cidade. Um sistema de assistência social robusto, com orçamento, infraestrutura e equipes dedicadas, é essencial para oferecer a garantia do acesso a renda e da proteção de direitos dessas pessoas, além de oportunidades para sair da pobreza.

Melhorar esse sistema foi um dos resultados mais importantes das duas fases do Projeto Salvador Social, da prefeitura da capital baiana, com apoio do Banco Mundial. Ao longo de cinco anos, o projeto ajudou a catalisar muitas iniciativas que já eram acalentadas pela administração local, tanto na assistência social quanto na saúde e na educação. 

Para saber mais sobre esse trabalho e seus impactos, é preciso primeiramente entender como funciona a assistência social em Salvador e em outros municípios do país. 

No Brasil, estar no Cadastro Único (CadÚnico) do governo federal é o primeiro passo para acessar programas e benefícios federais como o Bolsa Família, o Auxílio Gás e a tarifa social de energia elétrica. Por meio do Salvador Social, foi possível aumentar de 60 para 100 o número de entrevistadores que realizam essa tarefa em vários pontos da cidade e equipá-los com computadores conectados à internet, expandindo a cobertura do serviço e dando maior dignidade às pessoas atendidas. 

Um desses locais é o grande edifício histórico da Central do CadÚnico, no bairro do Comércio, um dos principais centros financeiros e de serviços da cidade. Ali, passam aproximadamente 1.200 pessoas de segunda a sexta e 600 aos sábados. O projeto investiu em reformas na infraestrutura para incluir o atendimento no fim de semana e instalar um sistema de ar-condicionado – essencial numa cidade tão quente –, por exemplo. 

“Aqui é uma porta de entrada para toda a assistência social. Trabalhamos muito com o Cadastro Único e outros benefícios, especialmente os voltados para a população de rua, mas recebemos todo tipo de demanda. Até parto já fizemos aqui”, conta Ivana Tonhá, gerente de gestão do Cadastro Único e benefícios sociais da Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (SEMPRE). 

“Sabemos que vir aqui tem um custo para cada pessoa; às vezes, é um gasto equivalente ao de comprar um pão para a família. Por isso, é importante atender bem aos usuários, para eles não ficarem vindo e voltando”, completa Ivana. 

A merendeira aposentada Célia Santos, 65 anos, testemunhou ao longo dos anos as melhorias na estrutura e no atendimento do local. “Ficou bem organizado e as pessoas são muito educadas. Nota 10!”, elogia ela, que foi ao prédio pedir para se descadastrar da tarifa social de energia elétrica.  

Fora da Central do CadÚnico, é possível registrar-se em 33 unidades de atendimento ou pelo CadÚnico itinerante, com ônibus e caminhões que percorrem vários bairros de Salvador. 

Antes da pandemia, tínhamos no máximo 350 mil famílias na base do Cadastro Único. Hoje, são 600 mil. Desmembrando, dá mais de 1,5 milhão de pessoas
Emanuele Rodovalho
Diretora de atenção básica da SEMPRE
The World Bank

É possível avistar habitações precárias em várias partes de Salvador

Concurso público

Também fazem parte da estrutura de assistência social do Brasil – e de Salvador, claro – o Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) e o Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS). O primeiro deles trabalha com a prevenção das situações de vulnerabilidade social. Encontram-se lá diversos programas, benefícios e atividades para acompanhar as famílias que estão em situações de vulnerabilidade. Já o segundo entra em ação quando ocorrem violações de direitos, como eventos de violência de gênero, abandono de crianças ou situações que requeiram medidas socioeducativas. Muitas vezes, os dois atuam em conjunto, mas são equipamentos distintos.

Atualmente, Salvador conta com 28 CRAS e sete CREAS, distribuídos em 170 bairros. Não é o suficiente. “Salvador precisaria ter 55 CRAS, mas isso exigiria financiamento estadual e federal”, explica Emanuele Rodovalho, diretora de atenção básica da SEMPRE. 

Ela continua: “Antes da pandemia, tínhamos no máximo 350 mil famílias na base do Cadastro Único. Hoje, são 600 mil. Desmembrando, dá mais de 1,5 milhão de pessoas. Cada CRAS tem condições de acompanhar até mil famílias”. 

Apesar de o sistema municipal de assistência social ainda não ter dimensões suficientes para dar conta da carência da população, Emanuele descreve o Salvador Social como um divisor de águas. “Ele trouxe a possibilidade de melhorar a estrutura física, a composição das equipes, a prestação dos serviços”, detalha. 

Na primeira fase do Salvador Social, nove CRAS foram requalificados: receberam reforma e/ou novos móveis. Mais 10 mudaram de endereço, rumo a lugares maiores e com acessibilidade melhor. Em todos os casos, a comunicação visual (sinalização para os usuários, por exemplo) e a estrutura tecnológica foram incrementadas. 

Com apoio do projeto, a SEMPRE ainda teve condições de realizar o primeiro concurso público voltado a profissionais para trabalhar na assistência social. Antes, eram usados cadastros gerais ou de pessoas de outras equipes do município, o que gerava alta rotatividade nos locais de atendimento.  

Na fase 2 do projeto, foi a vez de seis CREAS serem reformados e equipados para receber os usuários com mais qualidade.

The World Bank

Elisama Brandão e a filha Evelyn

Espaço modelo

Inspirado pelos aprendizados e os bons resultados do Salvador Social, o município fez investimentos com recursos próprios. Um deles foi a construção do CRAS Valéria, inaugurado em dezembro de 2023. Cobrindo a população de cinco bairros da periferia, o local conta com 18 ambientes dispostos em dois andares. Há espaços – todos climatizados – para atendimento social e psicológico, ambientes para oficinas, sala para atendimento de Cadastro Único e brinquedoteca. Também estão disponíveis wi-fi gratuito e elevador. 

Trata-se de um CRAS modelo, ou seja, todos do município agora deverão seguir esse padrão, tanto na infraestrutura quanto na oferta dos serviços. 

“Fui muito abençoada por este CRAS. Aqui, conquistei o Bolsa Família e o auxílio-moradia, e todos nos atendem bem”, conta Elisama Brandão, 43 anos, atualmente desempregada. Antes, ela pedia dinheiro e comida na rua para sustentar sozinha os cinco filhos, com idades entre oito e 18 anos. “Agora consigo pagar o aluguel, comprar roupas e sapatos para eles”, acrescenta. Vale lembrar que o Bolsa Família tem contrapartidas como exigir que as crianças frequentem a escola e estejam com as carteirinhas de vacinação em dia. 

“As instalações ficaram perfeitas e o atendimento é bom. Tratam a mim e a minha filha com muito carinho”, elogia Andresa Santos (acima), 25 anos. Mãe solo, sem rede de apoio, ela precisou pedir demissão quando Bella Ayla nasceu, há quase três anos. Por isso, no momento, ela conta com o Bolsa Família e sonha arrumar um emprego assim que conseguir matricular a menina em uma creche. “Quero um trabalho honesto. E, para a minha filha, que tenha tudo de melhor e seja uma grande mulher”, conta.  

Embora os obstáculos sejam consideráveis, em especial numa cidade como Salvador, histórias assim motivam os profissionais do setor a perseverar e se preparar para os próximos desafios. Elas também mostram que a assistência social pode ter um impacto transformador na vida dos mais pobres ao reduzir desigualdades e exclusão, criar oportunidades e encerrar o ciclo intergeracional de pobreza.

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