REPORTAGEM

Em Salvador, comunidades pobres se unem para preservar o meio ambiente e a herança cultural africana

2 de março de 2013


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Cachoeira de Oxum, no Parque São Bartolomeu: reserva de Mata Atlântica mede o equivalente a 155 campos de futebol.

Mariana Ceratti / Banco Mundial

DESTAQUES DO ARTIGO
  • A área do Parque São Bartolomeu, em Salvador, passa por uma revitalização. Serão beneficiadas 201 mil pessoas em quatro bairros pobres.
  • O parque tem uma das poucas reservas urbanas de Mata Atlântica do país.
  • O local também é sagrado para os adeptos do candomblé.

Os praticantes do candomblé têm no Parque São Bartolomeu – uma área de 155 hectares de Mata Atlântica – um local sagrado. Tanto que batizaram uma das cachoeiras de Oxum, em homenagem à bela orixá das águas doces.

“Acho que Oxum não anda nada feliz”, diz a mãe de santo Dona Vilma (nascida Maria Ventura da Silva). “Olha só essas flores de plástico; o pessoal deixa como oferenda, mas não se dá conta de que elas poluem a água e a terra.”

Dona Vilma trabalha como zeladora do parque há 35 anos. Até recentemente, também morava e comandava um terreiro de candomblé ali. Em todo esse tempo, ela assistiu à degradação ambiental do lugar. Agora, será testemunha da recuperação do São Bartolomeu.

O Banco Mundial e o governo da Bahia estão à frente do projeto Dias Melhores na região. A iniciativa tem o objetivo de preservar o parque e oferecer infraestrutura, moradia e serviços sociais sustentáveis àqueles que vivem no local e nos arredores.

O projeto deverá ser concluído no fim do ano. Até lá, terá impactado quatro bairros pobres e 201 mil pessoas – a começar pelas 1030 famílias que estão sendo reassentadas. A maior parte delas corria risco constante de perder as próprias casas devido a enchentes e deslizamentos de terra.


" Queremos preservar a cultura do candomblé e garantir que os adeptos continuem fazendo seus rituais, mas sem agredir o meio ambiente. "

Carolina Homem

Coordenadora de desenvolvimento social do projeto Dias Melhores

Casas seguras

“Perdi meus móveis não sei quantas vezes, vi muita gente morrendo, mas não me mudava de lá porque não tinha dinheiro”, lembra outra mãe de santo, Cícera Silva. “Adoro minha casa nova, é muito mais segura”.

Assim como Cícera, essas famílias vão se mudar para 1000 conjuntos habitacionais próximos, onde terão acesso a água, saneamento, eletricidade e escritura do imóvel. Aos que não quiseram se mudar para as novas construções, foi oferecida uma indenização que os permitiu comprar uma casa nova em outro lugar.

Os terreiros de Cícera e Dona Vilma se mudaram, bem como a praça de alimentação e a creche que funcionavam na região. Essa última será transferida para um prédio mais espaçoso, onde 200 crianças (de 2 a 12 anos) terão acesso a reforço escolar e aulas de artes.

Além disso, estão sendo construídos três centros comunitários e quadras de esporte ao redor do São Bartolomeu.

Rituais preservados

As áreas desocupadas já passam por limpeza – e, em breve, a vegetação será replantada nos locais desmatados. Ainda está em construção uma trilha que permitirá explorar o parque facilmente.

A ideia é que o parque seja cercado, tenha um horário de funcionamento definido e policiamento em tempo integral.

O governo da Bahia também chamará a comunidade (em especial, os adeptos do candomblé) para discutir o plano de manejo do parque.

“Queremos preservar essa cultura e garantir que eles continuem fazendo seus rituais, mas sem agredir o meio ambiente”, diz a antropóloga Carolina Homem, coordenadora de desenvolvimento social do projeto.

Oxum, a deusa das cachoeiras – e também da diplomacia – certamente há de ser invocada pelos fiéis nesse momento tão importante de debate.


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