Nova pesquisa oferece manual para o crescimento de qualidade no século XXI
WASHINGTON, 1º de agosto de 2024 — Mais de 100 países (entre os quais China, Índia, Brasil e África do Sul) enfrentam sérios obstáculos que podem prejudicar seus esforços para se tornarem países de renda alta nas próximas décadas. Isso é o que revela um novo estudo do Banco Mundial, que contém o primeiro roteiro abrangente para que os países em desenvolvimento possam escapar da chamada “armadilha da renda média”.
Com base nos aprendizados dos últimos 50 anos, o Relatório de Desenvolvimento Mundial 2024 constata que, à medida que os países ficam mais ricos, eles tendem a cair numa “armadilha” — normalmente, quando atingem cerca de 10% do PIB per capita anual dos EUA, ou o equivalente a US$ 8 mil atualmente. Esse valor está no centro da faixa que o Banco Mundial classifica como renda média. Desde 1990, apenas 34 economias de renda média conseguiram migrar para o status de renda alta; dessas, mais de um terço se beneficiaram da adesão à União Europeia ou da descoberta de novas jazidas de petróleo.
No final de 2023, 108 países foram classificados como países de renda média, com um PIB per capita anual variando de US$ 1.136 a US$ 13.845. Esses países abrigam 6 bilhões de pessoas, o que equivale a 75% da população mundial; e duas em cada três dessas pessoas vivem em pobreza extrema. Eles geram mais de 40% do PIB global e respondem por mais de 60% das emissões de carbono. Enfrentam, também, desafios muito maiores que seus antecessores na tentativa de escapar da armadilha da renda média: o rápido envelhecimento da população, o aumento do protecionismo nas economias avançadas e a necessidade de acelerar a transição energética.
“A batalha pela prosperidade econômica global será, em grande parte, vencida ou perdida nos países de renda média”, disse Indermit Gill, economista-chefe do Grupo Banco Mundial e vice-presidente sênior para Economia do Desenvolvimento. “Muitos desses países continuam a adotar estratégias obsoletas para se tornarem economias avançadas. Por tempo demais, permanecem dependentes apenas dos investimentos; ou, em alguns casos, buscam inovação de forma prematura. É necessária uma nova abordagem: inicialmente, foco em investimentos; em seguida, ênfase na infusão de novas tecnologias provenientes do exterior; e, por fim, adoção de uma estratégia tripla que equilibre investimento, infusão e inovação. Com o aumento das pressões demográficas, ecológicas e geopolíticas, não podemos nos dar ao luxo de errar.”
O relatório propõe uma Estratégia 3i para os países alcançarem o status de renda alta. Dependendo de seu estágio de desenvolvimento, todos os países precisam adotar uma combinação de políticas sequenciadas e com grau crescente de sofisticação. Os países de renda baixa podem se concentrar apenas em políticas destinadas a aumentar os investimentos — a fase 1i. Uma vez atingido o status de renda média baixa, terão de mudar de rumo e expandir seu conjunto de políticas para a fase 2i: investimento e infusão, que consiste em adotar tecnologias externas em toda a economia. Ao atingirem o nível de renda média alta, os países devem avançar rumo à fase 3i final: investimento, infusão e inovação. Na fase de inovação, os países já não se limitam a tomar ideias emprestadas das fronteiras globais da tecnologia: eles próprios passam a expandir essas fronteiras.
“O caminho a seguir não será fácil, mas é possível realizar progressos mesmo nas condições desafiadoras de hoje”, disse Somik V. Lall, diretor do Relatório de Desenvolvimento Mundial 2024. “O sucesso dependerá de quão bem as sociedades conseguirem equilibrar as forças de criação, preservação e destruição. Os países que tentarem poupar seus cidadãos das dores associadas às reformas e à abertura perderão os ganhos resultantes do crescimento sustentado.”
A Coreia do Sul oferece um exemplo notável de todas as três fases da Estratégia 3i, afirma o relatório. Em 1960, sua renda per capita era de apenas US$ 1.200; ao final de 2023, havia atingido US$ 33 mil. A Coreia do Sul começou com uma combinação simples de políticas para aumentar o investimento público e encorajar o investimento privado. Na década de 1970, isso se transformou numa política industrial que incentivava as empresas nacionais a adotarem tecnologias estrangeiras e métodos de produção mais sofisticados.
As empresas coreanas responderam bem a isso. A Samsung, que já foi uma fábrica de macarrão, começou a produzir aparelhos de TV para os mercados nacional e regional. Para fazer isso, obteve uma licença para usar tecnologias de empresas japonesas, como a Sanyo e a NEC. O sucesso da Samsung aqueceu a demanda por engenheiros, gestores e outros profissionais qualificados. Por sua vez, o governo sul-coreano reagiu à demanda. O Ministério da Educação estabeleceu metas — e aumentou orçamentos — para as universidades públicas ajudarem a desenvolver os novos conjuntos de competências exigidos pelas empresas nacionais. Atualmente, a Samsung é uma inovadora global por conta própria e uma das duas maiores fabricantes de smartphones do mundo.
Outros países seguiram caminhos semelhantes, como a Polônia e o Chile. A Polônia se concentrou em aumentar a produtividade com tecnologias provenientes da Europa Ocidental. O Chile incentivou a transferência de tecnologias do exterior e as usou para impulsionar a inovação interna. Um de seus maiores sucessos envolveu a adaptação das tecnologias norueguesas de criação de salmão às condições locais, tornando o Chile um dos principais exportadores desse pescado.