Até 2030, cerca de 600 milhões de pessoas enfrentarão dificuldades pra viver com menos de US$2,15 por dia
WASHINGTON, 5 de outubro de 2022— Segundo um novo estudo do Banco Mundial, é improvável que o mundo consiga atingir a meta de erradicação da pobreza extrema até 2030 na ausência de taxas de crescimento econômico que mudem o rumo da história até o final desta década. Esse estudo considera que a Covid-19 causou o maior revés nos esforços globais para a redução da pobreza desde 1990, e a guerra da Ucrânia ameaça piorar a situação.
O mais recente relatório do Banco, Poverty and Shared Prosperity (Pobreza e Prosperidade Compartilhada, em tradução livre) oferece a primeira análise completa do cenário global da pobreza após a inesperada onda de choques que afetaram a economia global ao longo dos últimos anos. O relatório estima que a pandemia levou aproximadamente 70 milhões de pessoas à pobreza extrema em 2020, o maior aumento ocorrido em um ano desde o início de seu monitoramento global em 1990. Isso levou aproximadamente 719 milhões de pessoas a subsistirem com menos de US $2,15 por dia no final de 2020.
O avanço rumo a redução da pobreza extrema foi praticamente interrompido pelo quase imperceptível crescimento econômico global”, disse o presidente do Grupo Banco Mundial, David Malpass. “Diante de nossa missão, nos preocupa o aumento na pobreza extrema e o declínio na prosperidade compartilhada resultantes da inflação, da depreciação de moedas, e das crises mais amplas e sobrepostas que desafiam o desenvolvimento. Isso gera uma perspectiva sombria para bilhões de pessoas em todo o mundo. As políticas macroeconômicas devem ser ajustadas visando melhorar a alocação de capital global, promoção da estabilidade das moedas, redução da inflação, e retomada do crescimento da renda mediana. A alternativa é o status quo – desaceleração do crescimento global, taxas de juros mais altas, maior aversão ao risco e fragilidade em diversos países em desenvolvimento.
O relatório aponta que 2020 foi o marco de uma reviravolta histórica—quando a era da convergência global de renda sucumbiu à divergência. As pessoas mais pobres pagaram o preço mais alto da pandemia: as perdas de renda atingiram 4% em média para os 40% mais pobres, o dobro das perdas dos 20% mais ricos em termos de distribuição de renda. Consequentemente, a desigualdade global aumentou pela primeira vez em décadas.
Medidas de política fiscal robustas fizeram uma diferença significativa na redução do impacto da Covid-19 sobre a pobreza. Na verdade, a taxa média de pobreza nas economias em desenvolvimento teria sido 2,4 pontos percentuais mais alta sem as medidas fiscais. No entanto, os gastos públicos foram muito mais favoráveis à redução da pobreza nos países mais ricos, que conseguiram, de modo geral, neutralizar totalmente os impactos da Covid-19 sobre a pobreza por meio de políticas fiscais e outras medidas assistenciais emergenciais. As economias em desenvolvimento dispunham de menos recursos e, portanto, gastaram menos e tiveram menor impacto; as economias de renda média-alta neutralizaram apenas 50% do impacto sobre a pobreza, e as economias de renda baixa e média-baixa neutralizaram cerca de um quarto do impacto.
“Ao longo da próxima década, será fundamental investir em melhorar os índices de saúde e educação para as economias em desenvolvimento, considerando as graves perdas de aprendizagem e as dificuldades enfrentadas na área de saúde durante a pandemia,” disse Indermit Gill, Economista-Chefe e Vice-Presidente Sênior para Economia do Desenvolvimento do Banco Mundial. “Em tempos de dívida recorde e escassez de recursos fiscais, isso não será fácil. Os governos precisarão concentrar os seus recursos na construção do capital humano e na maximização do crescimento.”
O novo relatório é o primeiro a oferecer dados atuais e históricos sobre a nova linha de pobreza extrema global, que foi ajustada para US$2,15 por dia para refletir os últimos dados de paridade de poder de compra de 2017. A pobreza extrema foi drasticamente reduzida em todo o mundo entre 1990 e 2019, o último ano para o qual há dados oficiais disponíveis. Mas o progresso desacelerou após 2014, e os formuladores de políticas enfrentam agora um ambiente mais complexo: a pobreza extrema está concentrada em locais onde será mais difícil erradicá-la—na África Subsaariana, nas áreas afetadas por conflitos e nas áreas rurais.
A África Subsaariana concentra atualmente 60% de todas as pessoas em situação de pobreza extrema — 389 milhões, mais do que em qualquer outra região. A taxa de pobreza na região gira em torno de 35%, a mais alta do mundo. Para alcançar a meta de 2030, cada país na região deveria apresentar um crescimento de 9% ao ano no PIB per capita até o fim desta década. Isso é um tremendo obstáculo para países cujo crescimento da renda per capita girou em torno de 1,2%, em média, na década anterior à Covid-19.
Segundo o relatório, as reformas de políticas públicas nacionais podem ajudar a retomar os avanços na redução da pobreza. A intensificação da cooperação global também será necessária. Em termos de política fiscal, os governos devem agir prontamente em três frentes:
- Evitar subsídios gerais, aumentar transferências de renda direcionadas: Metade de todos os gastos em subsídios energéticos nas economias de renda baixa e média vai para os 20% mais ricos da população que consomem mais energia. As transferências de renda são um mecanismo muito mais eficaz para assistir os grupos pobres e vulneráveis.
- Concentrar-se no crescimento a longo prazo: Investimentos de alto retorno em educação, pesquisa e desenvolvimento, e projetos de infraestrutura precisam ser feitos imediatamente. Dada a escassez de recursos, será fundamental aumentar a eficiência dos gastos e se preparar melhor para as próximas crises.
- Alocar as receitas internas sem prejudicar os pobres. Impostos sobre a propriedade e sobre o carbono podem ajudar a aumentar a receita sem afetar os mais pobres, assim como a ampliação da base dos impostos de renda de pessoa física e de pessoa jurídica. Se for realmente necessário aumentar impostos, como o ICMS e o IPI, os governos devem minimizar as distorções econômicas e os impactos negativos da distribuição ao usar simultaneamente as transferências de renda direcionadas para neutralizar os seus efeitos sobre os mais vulneráveis.
Baixe o relatório Pobreza e Prosperidade Compartilhada 2022