Já se nota uma mudança para padrões de comércio mais caros; a transição para energias mais limpas pode ter de ser adiada.
WASHINGTON, 26 de abril de 2022 — A guerra na Ucrânia causou um grande choque nos mercados de commodities, alterando os padrões globais de comércio, produção e consumo. Como resultado disso, os preços se manterão em níveis historicamente altos até o final de 2024, de acordo com o último relatório do Banco Mundial intitulado Panorama dos Mercados de Commodities.
O aumento dos preços de energia verificado durante os dois últimos anos foi o maior desde a crise do petróleo de 1973. Os aumentos dos preços de commodities alimentares — das quais a Rússia e a Ucrânia são grandes produtores — e dos fertilizantes, que dependem do gás natural como insumo de produção, foram os maiores desde 2008.
“Em termos gerais, isso representa o maior choque de commodities vivenciado desde a década de 1970. Assim como naquela época, o choque está sendo agravado por um aumento nas restrições ao comércio de alimentos, combustíveis e fertilizantes,” disse Indermit Gill, vice-presidente de Crescimento Equitativo, Finanças e Instituições do Banco Mundial. “Esses desdobramentos começam a dar sinais de alerta sobre uma possível estagflação. Os formuladores de políticas públicas devem aproveitar todas as oportunidades disponíveis para aumentar o crescimento econômico interno e evitar ações que prejudiquem a economia global.”
Os preços da energia devem aumentar mais de 50% em 2022, antes que comecem a recuar em 2023 e 2024. Prevê-se que os preços das commodities não energéticas, tais como produtos agrícolas e metais, aumentem quase 20% em 2022 e também recuem nos anos seguintes. No entanto, os preços das commodities devem permanecer bem acima da última média quinquenal. No caso de uma guerra prolongada ou de sanções adicionais à Rússia, os preços podem se tornar ainda mais altos e mais voláteis que as projeções atuais.
Devido às interrupções no comércio e na produção provocadas pela guerra, o preço do petróleo bruto (Brent) deve atingir uma média de US$ 100 por barril em 2022, seu nível mais alto desde 2013, o que representa um aumento de mais de 40% em relação a 2021. Os preços devem recuar para US$ 92 em 2023 — bem acima da média quinquenal de US$ 60 por barril. A expectativa é que, em 2022, o preço do gás natural na Europa chegue ao dobro do que era em 2021, ao passo que os preços do carvão devem ficar 80% mais altos. Em ambos os casos, seriam máximas históricas.
“Os mercados de commodities estão passando por um dos maiores choques de oferta em várias décadas devido à guerra na Ucrânia,” disse Ayhan Kose, diretor do Grupo de Perspectivas do Banco Mundial, responsável pelos relatórios da série Panoramas. “O aumento resultante nos preços de alimentos e energia está impondo um ônus humano e econômico significativo — e provavelmente impedirá avanços na redução da pobreza. Preços de commodities mais altos exacerbam as pressões inflacionárias, já elevadas em todo o mundo.”
Prevê-se que os preços do trigo aumentem mais de 40%, atingindo um recorde histórico em termos nominais este ano. Isso aumentará a pressão sobre as economias em desenvolvimento que dependem de importações de trigo, principalmente da Rússia e da Ucrânia. Os preços dos metais devem subir 16% em 2022, antes de recuar em 2023, mas permanecerão em níveis elevados.
“Os mercados de commodities estão sob tremenda pressão, com alguns preços atingindo recordes históricos em termos nominais,” disse John Baffes, economista sênior do Grupo de Perspectivas do Banco Mundial. “Os efeitos em cascata serão duradouros. O forte aumento dos preços de insumos, como, por exemplo, energia e fertilizantes, pode levar a uma redução na produção de alimentos, principalmente nas economias em desenvolvimento. O menor uso de insumos terá um impacto na produção e na qualidade dos alimentos, afetando a disponibilidade alimentar, a renda das populações rurais e os meios de subsistência dos mais pobres.”
Foco especial: O impacto da guerra na Ucrânia nos mercados de commodities
A seção Special Focus [Foco especial] do relatório faz uma análise aprofundada do impacto da guerra nos mercados de commodities. Além disso, examina como esses mercados reagiram a choques semelhantes no passado. A análise conclui que o impacto da guerra pode ser mais duradouro que os choques anteriores por pelo menos duas razões.
Primeiramente, há menos espaço, na conjuntura atual, para substituir as commodities energéticas mais afetadas por outros combustíveis fósseis, porque os aumentos de preços foram amplos e afetaram todos os combustíveis. Em segundo lugar, o aumento nos preços de certas commodities também está elevando os preços de outras — por exemplo, os altos preços do gás natural elevaram os custos dos fertilizantes, pressionando os preços dos produtos agrícolas. Além disso, até agora, as políticas públicas introduzidas em resposta à crise se concentraram mais em cortes de impostos e subsídios — que muitas vezes exacerbam os déficits de oferta e as pressões sobre os preços — do que em medidas de longo prazo para reduzir a demanda e incentivar fontes alternativas de oferta.
A guerra também está levando a padrões de comércio mais caros, que podem resultar em uma inflação mais duradoura. Isso deve causar um grande desvio de comércio no setor de energia. Por exemplo, alguns países já estão buscando fornecedores de carvão de locais mais remotos. Ao mesmo tempo, alguns grandes importadores de carvão poderiam aumentar as importações da Rússia e reduzir a demanda de outros grandes exportadores. O desvio provavelmente custará caro, observa o relatório, porque envolve maiores distâncias de transporte — e o carvão é volumoso e caro para transportar. Desvios semelhantes estão ocorrendo com o gás natural e o petróleo.
No curto prazo, os preços mais altos ameaçam interromper ou atrasar a transição para formas de energia mais limpas. Vários países anunciaram planos para aumentar sua produção de combustíveis fósseis. Os altos preços dos metais também estão elevando o custo da energia renovável, que depende de insumos como alumínio e níquel para baterias.
O relatório insta os formuladores de políticas públicas a agir prontamente para minimizar os danos aos seus cidadãos e à economia global. Ele defende programas direcionados de segurança social — como programas de transferências de renda, alimentação escolar e obras públicas — em vez de subsídios para alimentos e combustíveis. Uma prioridade fundamental deve ser o investimento em eficiência energética, inclusive para a climatização de edificações. Ademais, o relatório conclama os países a acelerar o desenvolvimento de fontes de energia com zero carbono, como, por exemplo, as energias renováveis.