Em Santa Catarina, a quilômetros de um dos litorais mais visitados pelos jovens da América do Sul, encontra-se um grupo que vive sem praias, boates ou paqueras. Apesar disso, esses brasileiros de 20 e poucos anos estão muito bem: se sustentam, gerenciam os próprios negócios e ainda sofrem menos estresse que o vivido nas grandes cidades.
Eles nasceram no campo e – diferentemente dos pais, para quem o trabalho na roça foi inevitável – descobriram na agricultura uma verdadeira vocação, apesar da carga intensa de trabalho. Também encontraram nela a oportunidade de planejar um futuro profissional de longo prazo.
“Tudo é mais relaxado, a começar pela roupa que usamos”, diz Jilson Vargas, 25 anos. Ele chegou a aceitar um emprego de escritório, mas levava meia hora para ir e o mesmo tempo para voltar, passando por uma estrada de terra. “E tinha de andar de terno”, lembra.
A vida mudou quando o grupo de jovens rurais de que Jilson participa pôde finalmente adquirir máquinas para sofisticar a produção de vime, material usado na fabricação de cestos e móveis. Hoje, nem ele nem a esposa, Thaíse, de 20 anos, têm vontade de deixar o sítio, conectado à rede de telefonia celular.
Eles sabem que estão na contramão dos brasileiros e dos latino-americanos em geral: tanto no país quanto na região, cerca de 80% da população vive em cidades.
Ao mesmo tempo, o casal entende o quanto é necessário incentivar os jovens a ficar no campo. Afinal, caberá a eles – e aos filhos – cuidar da produção de matérias-primas agrícolas usadas em todas as indústrias.
Atualmente, 3 em cada 10 latino-americanos dependem da terra para a sobrevivência. Em países como México e Peru, estima-se que 20% dos jovens trabalhem na zona rural. No Brasil, 8 milhões de pessoas entre 15 e 29 anos vivem no campo, formando 27% da população rural.
O sonho dos millenials
Também está nas mãos dos mais novos produzir comida suficiente para alimentar 9 bilhões de bocas em 2050. É um desafio colossal, mas Josimar Sordi, 23 anos, contribui com prazer.
Antes mesmo de se formar em zootecnia, ele tem a oportunidade de gerenciar o processamento de carne na pequena fábrica fundada pelos Sordi e mais duas famílias há quase um ano. Vinte tipos de produtos saem dali rumo aos mercados da região.
“Essa fábrica era um projeto meu e de um primo, que morreu aos 23, de leucemia, um mês antes de realizar seu sonho”, emociona-se Josimar. “Nós trabalhávamos em um frigorífico e vivíamos falando de como seria o nosso negócio”, acrescenta.
A história dele evoca uma das características mais presentes nas pesquisas sobre os millenials – a geração que hoje tem entre 20 e 30 anos – e o mercado de trabalho: a competitividade e o desejo de crescer rapidamente no emprego.
E, como o próprio Josimar faz questão de dizer, a zona rural tem muitas possibilidades para o jovem que quer empreender, desde que haja condições para isso, a começar pela infraestrutura: estradas, eletrificação rural, internet e telefonia celular.
“Se o processo de criação de uma empresa for caro e demorado, os jovens estarão menos dispostos a fazer negócios. É preciso facilitar isso, bem como os processos de certificação de produtos e serviços”, acrescenta o economista Diego Arias, do Banco Mundial, que está à frente do programa Santa Catarina Rural.
O programa, uma parceria entre o Banco e o governo do estado, é exatamente o que vem permitindo a empreendedores como Jilson e Josimar ter um projeto de vida ligado ao campo. Iniciativas semelhantes vêm dando certo em países tão distantes quanto Armênia, Camarões, Malawi, Senegal e Sri Lanka.
Brinde com suco
Dados também do Banco Mundial mostram que investir na agricultura não sai caro quando se avaliam os benefícios para os produtores rurais: o aumento de renda associado com essa atividade é de 2 a 4 vezes mais eficaz na redução da pobreza do que o crescimento originado em outros setores.
Foi com alguns investimentos e muita persistência que os pais de Estevão e Leonardo Ferrari – de 23 e 21 anos, respectivamente – conseguiram prosperar dispondo de apenas 3 hectares de terra. Depois de tentar plantar de tudo, sem sucesso, o casal participou de um programa de cultivo de uvas iniciado pela prefeitura da cidade em 2001.
“Para nosso pai, era a última chance de fazer alguma coisa dar certo aqui e, por isso, ele se apressou em deixar o parreiral pronto e bem cuidado”, lembra Estevão. As frutas se adaptaram tão bem que, em três anos, a família vendia não só as uvas a granel, mas também o suco.
De lá para cá, uma série de programas (inclusive o SC Rural) ajudou a família a aumentar a plantação para os atuais 4 mil pés, proteger as uvas do frio e enviar Leonardo para estudar enologia em Cádiz, na Espanha. “Nosso sonho é começar a produzir vinho”, conta o rapaz.
Enquanto se preparam para isso, os irmãos comandam uma loja onde vendem produtos da agricultura familiar, inclusive o suco de uva. “Ele faz sucesso entre os jovens e os adeptos da alimentação saudável. Miramos nesse público para fazer nosso marketing”, ressalta Leonardo.
E assim, brindando com suco natural – e não com os drinques típicos das festas urbanas –, trocando a vida noturna pelo trabalho que começa cedo, brasileiros como eles descobrem oportunidades e alegrias fora da cidade. “Venham conosco”, convida o bem humorado Estevão a todos os jovens em busca de uma boa chance.