A economia brasileira tem se recuperado lentamente da crise econômica trazida pela pandemia de COVID-19. Após uma queda histórica de 3,3% em 2020, o PIB real foi maior em 2021 do que em 2019. Em 2022, o PIB registrou crescimento de 2,9%. Os indicadores do mercado de trabalho também refletem essa recuperação econômica. Embora a participação na força de trabalho ainda esteja ligeiramente abaixo do nível pré-pandemia (62,1%), aqueles que participam têm maior probabilidade de encontrar emprego: a taxa de desemprego foi de 7,9% no quarto trimestre de 2022, 3,2 pontos percentuais abaixo do que a registrada no ano anterior e 6,2 pontos menor do que em 2020 (4º trimestre).
A população vulnerável foi protegida por grandes mudanças no sistema de proteção social, mas houve um aumento da dependência das transferências governamentais. Apesar da crise econômica induzida pela COVID-19, a taxa de pobreza no país mensurada a partir da linha de 6,85 dólares por dia (PPC 2017) recuou de 26,2% em 2019 para 18,7% em 2020, em grande parte graças às transferências de renda do programa Auxílio Emergencial– com o qual o governo gastou cerca de 3,9% do PIB. Os ganhos monetários promovidos, contudo, não foram fiscalmente sustentáveis, os pagamentos do governo encolheram, e a pobreza retornou com força em 2021 alcançando a taxa de 28,4%, em parte devido à redução da cobertura do Auxílio pela metade. Para 2022, projeta-se que a renda real do trabalho das famílias tenha finalmente ultrapassado os níveis de 2019. Projeções do Banco Mundial indicam que a recuperação no mercado de trabalho em conjunto com o reajuste dos benefícios do Bolsa Família faça a taxa de pobreza recuar para o que parece ser a trajetória pré-pandemia, a aproximadamente 24,3%. A previsão de baixo crescimento econômico provavelmente se traduzirá em baixo crescimento da renda entre os menos favorecidos e manterá a alta correlação entre pobreza e transferências governamentais.
Para além da taxa de pobreza, outros indicadores sociais apontam para a necessidade de políticas públicas urgentes: 30,7% da população sofria com insegurança alimentar moderada ou grave no país em 2022. Nos últimos anos, a diminuição do papel da renda do trabalho na redução da pobreza entre os brasileiros fez com que a dependência da renda não laboral fosse acompanhada por uma volatilidade nos rendimentos, fator que contribuiu para o aumento da insegurança alimentar. Pelo menos desde 2014, o Brasil havia saído do Mapa da Fome da FAO. A taxa de insegurança alimentar moderada e grave medida com os dados da PNAD foi de 7,8% em 2013, em comparação com 16,8% quase uma década antes. No entanto, os Inquéritos Nacionais sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil mais recentes sugerem que 20,5% da população brasileira vivenciou insegurança alimentar moderada ou grave em dezembro de 2020, taxa que subiu para 28,4% entre novembro de 2021 e abril de 2022. Além disso, a taxa de Insegurança Alimentar na zonas rural é 20% maior do que na zona urbana.
A constante alta da inflação de alimentos também pode ter agravado a insegurança alimentar nos últimos anos. O Brasil é um dos principais produtores agrícolas do mundo. Mas a atividade agrícola brasileira está amplamente conectada às cadeias de suprimentos e exportações globais, limitando assim sua capacidade de proteção aos consumidores internos quando os preços internacionais das commodities sobem. Enquanto o índice geral de preços ao consumidor brasileiro subiu 21,7% entre o final de 2019 e o final de 2022, os preços dos alimentos subiram 37,5% no mesmo período.
Ainda mais preocupante é que os estados tipicamente mais vulneráveis têm sofrido os piores efeitos da inflação e da insegurança alimentar. Os preços dos alimentos, componente que representa entre um quinto e um quarto das despesas das famílias mais vulneráveis, tiveram um enorme impacto negativo no poder de compra delas. Assim, não sem razão, alguns dos estados mais pobres do país apresentam os piores números em insegurança alimentar. Nos estados mais vulneráveis das regiões Norte e Nordeste, os preços dos alimentos subiram tanto quanto os dos estados mais ricos do Sul e Sudeste. Com menor capacidade de lidar com a alta dos preços, entretanto, as famílias dos estados mais carentes, como Maranhão e Pará, vivenciam um grau preocupante de insegurança alimentar.