O Relatório de Capital Humano Brasileiro (RCHB) conta uma história sobre talentos perdidos no Brasil.
A seguinte pergunta é feita: que aconteceria com a produtividade do trabalho se o Brasil oferecesse educação e saúde de qualidade a todas as crianças, em todas as partes do país? Como reduzir a lacuna entre as circunstâncias ideais e o que de fato ocorre?
O RCHB é parte do Human Capital Project, uma iniciativa global do Banco Mundial que visa alertar os governos sobre a importância de investir nas pessoas. As evidências justificam essa abordagem. Analisar as tendências de acumulação de capital humano ajuda a explicar por que a desigualdade de renda tem permanecido em patamares tão elevados ao longo dos anos e sugere também por que em média os brasileiros tendem a permanecer na pobreza por várias gerações
A história do talento desperdiçado começa com uma proposta de indicador para monitorar os avanços na acumulação de capital humano no Brasil: o Índice de Capital Humano (ICH). O ICH estima a produtividade esperada de uma criança nascida hoje aos 18 anos de idade, em um contexto onde as condições de educação e saúde permanecem inalteradas. Essa proposta traz contribuições fundamentais para o diálogo sobre políticas públicas.
Em primeiro lugar, o ICH é uma medida prospectiva. O índice calcula a produtividade esperada da próxima geração de trabalhadores caso as circunstâncias se mantenham como estão. ICHs mais altos hoje significam maior produtividade do trabalho no futuro.
Em segundo lugar, o ICH é simples: considera apenas os principais aspectos que influenciam na formação de habilidades. Terceiro, o ICH proporciona uma narrativa clara com base no ciclo de vida: ao nascer, as crianças precisam sobreviver; na infância, precisam estar bem nutridas; em idade escolar, devem concluir todos os níveis de ensino e receber aprendizagem adequada; e na idade adulta, precisam de boa saúde.
Quarto, o ICH é orientado para resultados. Ele combina taxas de mortalidade e déficit de crescimento infantil, anos esperados de escolaridade (AEE), resultados de aprendizagem harmonizados (RAH) e taxas de sobrevivência de adultos em um único indicador para enfatizar resultados ao invés de insumos.
Quinto, o ICH tem um objetivo claro. O indicador não se propõe a medir o bem-estar social ou concatenar valores intrínsecos à vida humana; em vez disso, o ICH propõe uma estimativa da produtividade futura se as condições atuais persistirem.
As estimativas levam a um resultado final simples: o ICH varia de 0 a 1. Um município onde uma criança típica não corre o risco de sofrer de déficit de crescimento ou morrer antes dos cinco anos de idade recebe educação de alta qualidade e se torna um adulto saudável, terá um ICH próximo de 1. Por outro lado, quando o risco de má nutrição ou morte prematura é alto, o acesso à educação é limitado e a qualidade da aprendizagem é baixa, o ICH se aproxima de zero.
A primeira mensagem-chave deste relatório é que um brasileiro nascido em 2019 alcança em média 60 por cento (ICH de 0,60) de seu capital humano potencial aos 18 anos de idade. Quarenta por cento de todo o talento brasileiro permanece retido, invisível para a sociedade.
No entanto, a média nacional nos conta apenas uma pequena parcela de toda a história. Um ICH de 60 por cento esconde desigualdades locais e diferenças regionais na acumulação de capital humano. Com isso, a desagregação do ICH em nível municipal revela a segunda mensagem-chave deste relatório: muitos “Brasis” coexistem dentro do Brasil.
O mapeamento dos ICHs produz um retrato claro da desigualdade regional no Brasil: as crianças nascidas em municípios do Norte e Nordeste, por exemplo, desenvolvem aproximadamente metade de todo o seu potencial talento – ou 10 pontos percentuais (0,1 ponto do ICH) a menos que uma criança típica do Sudeste.